Conquista de Ceuta
Conquista de Ceuta

A conquista de Marrocos, início da Expansão Portuguesa

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Em paz com Castela, a Nobreza Portuguesa voltou a sua ânsia de conquista para o seu outro vizinho, Marrocos.

Quando Portugal conquistou Ceuta em 1415, o país já tinha desenvolvido no século anterior estreitas ligações comerciais com os países do Atlântico Norte e os da orla mediterrânica. De facto, a sua situação privilegiada, a meio caminho das rotas comerciais marítimas, cedo abriu Portugal para o exterior, de costas voltadas ao interior da península ibérica e ao inimigo castelhano. Com o aparecimento da Companhia da Naus e os privilégios concedidos pelo poder régio nos finais do século XIV à burguesia mercantil, as condições para a expansão portuguesa além-mar estavam reunidas. A ascensão ao trono da dinastia de Avis apoiada pela burguesia confirmou a vontade política de um Portugal virado para o comércio e a expansão.

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Motivos para a conquista de Marrocos

Não existe uma razão fundamental que explique o início da presença portuguesa em Marrocos. Terá sido um conjunto de razões económicas, políticas, religiosas, históricas e sociais que conduziram os portugueses de todos os estratos sociais à conquista do Norte de Africa. As circunstâncias favoráveis levaram Portugal para esse empreendimento, quase natural tendo em conta o contexto de crise que vivia a Europa. As consequências da Peste Negra ainda se faziam sentir, assim como a Guerra de Cem Anos. As rotas comerciais habituais estavam cortadas, as terras agrícolas ao abandono.

O reinado de D. João I atravessava uma grave crise económica e social, que o conflito com Castela agravou. O país, pároco em recursos agrícolas e em metais preciosos tão necessários para o seu comércio foi obrigado a procurar soluções alternativas ao vizinho castelhano. Com a paz assegurada em 1411, Portugal podia virar as suas atenções para outros objetivos.

Ceuta, ali tão perto, era um alvo privilegiado e acessível pela fragilidade do poder merínida. A sua conquista tinha duas vantagens imediatas. A primeira, a proteção dos navios cristãos dos corsários e por conseguinte do comércio. A segunda vantagem era política. Ao conquistar territórios aos muçulmanos, a nova dinastia de Avis adquiria prestígio e legitimação aos olhos da Cristandade, o seguimento lógico da Reconquista.

A conquista de Ceuta, envolta de sucesso, não era porem suficiente. Portugal continuava a precisar de trigo, que só a conquista dos territórios cerealíferos mais a sul podia proporcionar. Para mais, as rotas do ouro que outrora desembocavam em Ceuta foram desviadas. A conquista do Sul parecia ser a solução.

Muralhas de Mazagão
Muralhas de Mazagão

Conquistar ou explorar?

Dois caminhos abriam-se a Portugal, de interesses divergentes nesta primeira fase da expansão portuguesa. O primeiro caminho era o da nobreza, que queria continuar a conquista militar e territorial de Marrocos. Os seus objetivos eram claros, como a procura da guerra contra o infiel, a posse de novos domínios fontes de rendas e honrarias. O segundo caminho era o da burguesia mercantil, mais pacifico. Procurava-se parceiros comerciais com a exploração de novas terras e produtos.

O Infante D. Henrique, nos comandos da expansão portuguesa, privilegiou nesta fase a exploração sistemática da costa africana, até 1434. Nesta data, Gil Eanes tinha por fim dobrado o Cabo Bojador. Foi durante este primeiro período que se descobriu e colonizou os Açores e a Madeira, servindo de seguida como bases de apoio à exploração Atlântica. O intuito da exploração sempre teve na mente de D. Henrique a luta contra o muçulmano e a propagação da fé cristã. Era objetivo do Infante “avaliar com rigor o poderio islâmico naquelas paragens africanas”.

Termina a primeira etapa da expansão portuguesa com um profundo desaire de Portugal em Marrocos. O partido nobiliárquico, que tinha pesado fortemente pela continuação da conquista de novas praças aos marroquinos foi travado com o desastre de Tânger em 1437. Com a morte do rei D. Duarte em 1438, a burguesia pode, à revelia da nobreza, escolher D. Pedro como regente em 1439. Inicia-se desta forma uma nova etapa, favorável à continuação da exploração marítima.

O sucesso da exploração marítima

Os progressos técnicos recentes na arte de navegar permitiam doravante ir mais além. Este curto período de dez anos é marcado pela exploração e subsequente ocupação do Golfo de Arguim. A criação de uma feitoria permitiu aos portugueses o contacto direto com as grandes rotas caravaneiras. Os mercadores locais preferiam agora comerciar com a feitoria portuguesa, quebrando assim o monopólio dos nómadas cameleiros. Os proveitosos lucros que a nova feitoria potenciava atraíram e mobilizaram definitivamente a burguesia na exploração atlântica. O impacto económico em Portugal foi evidente. A aceleração do comércio, com a circulação de ouro, marfim, escravos, especiarias e principalmente cereais e açúcar trazem grandes benefícios à metrópole.

Mas a exploração encontrou dificuldades. As populações autóctones mostraram por vezes hostilidades para com os Portugueses, obrigando-os a abrandar os seus empreendimentos exploratórios. A morte de D. Pedro em 1449 marca o fim deste segundo período. Em meados do século XV, o Atlântico era agora uma prioridade económica para Portugal.

Pausa na exploração

A terceira etapa pode ser dividida em duas fases. Com a morte de D. Pedro às mãos da intriga urdida pelo grupo senhorial, a exploração abranda, para não dizer que para. Sem o patrocínio régio e com o agrave da hostilidade dos povos em contacto com os Portugueses, os incentivos para correr os riscos da exploração eram escassos. Estas dificuldades jogaram muito no abrandamento da atividade exploratória nesta primeira metade da terceira etapa da exploração marítima.

Retomava-se então, em detrimento da burguesia mercantil, as tentativas da conquista de Marrocos. Nesta altura, são os interesses privados que têm a iniciativa da continuação da exploração marítima. Fernão Gomes iniciará a segunda metade da terceira etapa. Este particular, com um monopólio concedido pelo rei, permitiu aos Portugueses acederem finalmente às imensas riquezas do Grande Golfo.

Com o fim do monopólio concedido a Fernão Gomes em 1474, a Coroa retomava a iniciativa da exploração. Era agora necessário proteger o comércio português da cobiça das outras potências europeias, a começar por Castela. A construção da Feitoria e Castelo de S. Jorge da Mina, acabada em 1482, marca o ponto culminante e final da terceira fase.

Castelo da Mina, no Gana atual
Castelo da Mina, no Gana atual

A última e quarta fase corresponde à abertura da rota marítima atlântica para o Indico. O objetivo de D. João II era claro: encontrar o caminho marítimo para a India. Consolidou-se o trato económico já existente com a preeminência da Feitoria da Mina. Dobrado o cabo das Tormentas, futuro cabo da Boa Esperança, os Portugueses chegariam a um mar já conhecido, com a ajuda de navegadores árabes. Vasco da Gama e a Rota do Cabo iniciam assim uma nova era do Império Português.

Apesar do sucesso da expansão marítima, a conquista de Marrocos ainda estava nas mentes dos Portugueses, até ao desastre de Sebastião, quase um século depois…

Bibliografia

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Conversa

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