A 14 de agosto de 1385, perto da aldeia de Aljubarrota, Dom João I, com o seu fiél condestável Dom Nuno Alvares Pereira derrotaram os Castelhanos, o que forjou a construção da nação portuguesa.
Para agradecer a Deus por esta vitória, o fundador da nova e lendária dinastia de Avis manda construir um dos mais belos mosteiros da peninsula ibérica: o Mosteiro de Santa Maria da Vitória, em Batalha.
Tomando a grande estrada nacional que liga Lisboa ao Porto, é impossível não ver, ao chegar à Batalha, este monumento. Estamos aqui no que representa a alma da independência portuguesa. A sua beleza e riquezas patrimoniais fazem do mosteiro um dos mais incríveis monumentos da Humanidade, pelos critérios da UNESCO.
Este lugar patriótico, de triste memória para os nossos irmãos espanhóis, é o símbolo da vitória militar portuguesa definitiva sobre Castela. O seu nome oficial de Nossa Senhora da Vitória comemora este grande feito luso.
História do mosteiro e da sua igreja
Batalha, é uma pequena vila portuguesa, cujo nome lhe vêm da grande vitoria de Portugal sobre os castelhanos, a Batalha de Aljubarrota. O rei, para agradecer a Deus por ter ganho a guerra contra o que viria a ser a moderna Espanha, mandou construir este fabuloso edifício. Assim, recorda-se para todo o sempre aquele dia de verão, a 14 de Agosto de 1385, onde Portugal assentou definitivamente a sua independência de Castela, ao ganhar a grande batalha. A obra começou imediatamente ou quase, em 1386, e perdurou por quase dois séculos.
O estilo gótico é raro em Portugal. A preferência dos portugueses ao longo da história foi para outros estilos, como o Românico ou o Barroco. A Batalha é o mais belo exemplar da Arte Gótica em Portugal, talvez com o mosteiro de Alcobaça. Os dois monumentos são ambos do mesmo estilo, mas bastante diferentes. A simplicidade de Alcobaça contrasta com a complexidade decorativa da Batalha. Ornamentos tão finos na Batalha que parecem renda. Aqui reside toda a diferença entre o Gótico primitivo de Alcobaça e o Gótico Tardio do nosso monumento, já fortemente influenciado pelo início da Renascença.
A nossa obra prima será principiada pelo arquitecto Afonso Domingues, um especialista do Gótico, sucedido depois pelo francês (ou catalão?) Mestre David Huguet, de 1402 a 1438.
Batalha é a obra de várias vidas. Obra que quase não existiria hoje, com os imensos estragos provocados pelo marechal Massena durante as invasões napoleónicas. Também não ajudaram à salvaguarda do mosteiro as expulsões dos dominicanos em 1834, no seguimento da extinção das ordens monásticas ordenadas pelo ministro da justiça de então, Joaquim Antonio de Aguiar.
A intervenção do “Rei Artista”, Dom Fernando II, será de primeira importância para a salvaguarda do património de Portugal: em 1840, por sua iniciativa, começa um grande programa de restauro do Mosteiro da Batalha.
A inscrição em 1983 do monumento no Património Mundial da Humanidade pela UNESCO valoriza e protege o mosteiro, esperemos, definitivamente de estragos futuros.
Um mosteiro dominicano, de estilo Gótico Tardio
A maioria dos elementos arquitectónicos do mosteiro são de estilo Gótico Tardio. A Batalha represente para o novo rei a afirmação do seu poder recém obtido. O mosteiro é de tradição dominicana, e nota-se: a ausência de torre sineira é uma das marcas mais evidentes. Mas se pensarmos bem, os dominicanos são secundários.
O rei Dom João I queria antes de mais assentar o seu poder e a sua gloria, celebrando a fantástica vitoria que obtivera, dando definitivamente a independência a Portugal frente ao reino de Castela. As proporções da igreja são propicias para glorificar o rei e a grande batalha: 80 metros de cumprido, 22 de largura e 32,5 de altura!
Os vitrais da igreja são provavelmente dos mais antigos de Portugal, uma arte introduzida no pais por artistas alemães. O despojo da igreja, tipicamente dominicana, sem estátuas, sem decorações, valorizam estes vitrais, que, durante uma tarde de Verão, iluminam o interior da igreja com mil cores.
Sendo que a construção do mosteiro durou dois séculos, ele será fortemente influenciado na Renascença pelo estilo que estava na moda, o Manuelino. Este estilo arquitectural, tipicamente português, é ricamente ornado com elementos que encontramos na marinha. Devemos lembrar-nos que no século XV, Portugal era a primeira potência marítima mundial. Podemos ver a influência do Manuelino nas janelas que dão para a entrada do Panteão de D. Duarte, também conhecido por “Capelas Imperfeitas”…
Capelas Imperfeitas, o Panteão de Dom Duarte
O Panteão de D. Duarte, mais conhecido por “Capelas Imperfeitas”, é o topo da arquitectura portuguesa da Idade Média. Sendo parte integrante do Mosteiro da Batalha, poderíamos qualificar estas capelas inacabadas do culminar da nossa visita. Alias, o sentido usual da visita exige que se termine o percurso neste imenso mosteiro pelo Panteão.
Cuidado: só se pode aceder às Capelas Imperfeitas por fora, não existe portas que comunicam da Igreja para as capelas.
O rei D. Duarte queria edificar um Panteão, uma extensão magnifica do que já era uma obra prima, o Mosteiro da Batalha. Mas, como se poder ver hoje, nunca chegou a ficar concluído. O projecto parece de facto demasiadamente ambicioso… ao que se diz. D. Duarte queria uma obra em conformidade com o desejo do seu predecessor, o rei D. João I, falecido em 1433. Quando D. Duarte morreu em 1438, só faltava a abóbada central para que a estrutura estivesse terminada.
Ao contrário do que a lenda reza, esta abóbada central não era uma dificuldade técnica impossível de resolver. A abóbada da sala do Capitulo deste mesmo mosteiro é de proporções equivalentes às que teria o Panteão caso tivesse sido realizado. Talvez nunca chegaremos a saber porque razão as capelas não chegaram a ser finalizadas… teríamos que perguntar ao Diogo de Boitaca, o mestre de Obras destes fantásticos pilares manuelinos, para sempre inacabados.
A construção das capelas vai demorar mais de um século para chegar ao seu estado actual. A obra é composta por sete capelas, dispostas em volta de uma forma octogonal. Será Mateus Fernandes a dar os últimos acabamentos, transformando por exemplo o portal manuelino alto de 15 m, do gótico original ao manuelino actual, terminado em 1509.
As capelas têm graus de acabamento diversos, conforme os monarcas que lá preparavam os seus mausoléus. Podemos ver que D. João II e a sua esposa Dona Leonor foram os que mais cuidados tiveram…
Claustro Real
Na pequena cidade da Batalha encontra-se um dos mais belos, se não é mesmo o mais belo, monumento gótico português: o Mosteiro da Batalha. Este mosteiro, símbolo da independência de Portugal em relação a Castela, foi edificado em torno do seu Claustro Real, o Claustro de Dom João I.
Vamos apresentar neste nosso artigo este fantástico claustro, frequentado por frades até ao século XIX, onde a Arte Manuelina encontra o seu esplendor.
O Mosteiro da Batalha está articulado em torno do Claustro Real, um quadrilátero de 50 m de lado. A igreja ocupa um dos lados. O claustro é cercado por arcadas em ogiva, dispostas num só piso. O primeiro arquitecto do claustro foi Afonso Domingues, criador inicial do projecto arquitectural do mosteiro. Dele, guardamos o inicio da obra, em 1386, e as duas primeiras galerias do claustro.
A obra será depois completada pelo Mestre David Huguet, que introduziu no país o Gótico Flamejante, e depois por Martim Vasques. O claustro só ficou completo em 1515, quando Mateus Fernandes dará os últimos retoques em Arte Manuelina.
Cada galeria do claustro é formada por sete arcadas em ogiva, ricamente decoradas, com motivos vegetais e emblemas reais de Dom Manuel: cruzes de Cristo e esferas armilares. No lado Norte podemos encontrar o Lavatório dos Dominicanos, onde os frades vinham lavar-se as mãos. Este lavabo foi decorado por Diogo Boitaca (ou Boytac, o que deixa pensar que ele pudesse ser de origem francesa). Não existe unidade de estilo entre as diferentes galerias, cada uma sendo uma descoberta por si só.
Em frente à Sala do Capitulo encontra-se, no chão, as datas de falecimento de alguns frades dominicanos. A cada pedra datada corresponde um túmulo, como aquele do bispo de Ceuta, que pode ver aqui em foto. O Claustro Real é muito diferente do Claustro Afonso V, que é mais modesto: era um claustro secundário, ao contrário do Claustro Real, o maior e principal claustro do Mosteiro da Batalha.
Fotos do Claustro Real
Capela do Fundador: túmulo dos Reis de Portugal
Este lugar possui uma forte carga simbólica para o povo português. Aqui estão sepultados o rei D. João I e a sua esposa, a rainha Filipa de Lencastre, assim como os seus filhos, a “Inclita Geração“. Estes soberanos correspondem ao início do apogeu de Portugal. Pelas suas iniciativas marcaram a sua época e a nossa civilização, por terem iniciado a Era dos Descobrimentos. O monumento que lhes é consagrado tinha obrigação de ser majestoso.
O grande arquitecto das Descobertas, o infante D. Henrique o Navegador têm aqui o seu túmulo, junto com os dos seus irmãos. Ricamente ornados, cada túmulo é esculpido na pedra, com os seus brasões respectivos. Fica-se impressionado ao estar de caras com a última morada de quem propulsou a Europa na Renascença, abrindo-lhe novos mundos!
D. Henrique criou as condições necessárias para que grandes exploradores pudessem surgir, nomeadamente a Escola de Sagres. Nesta escola de navegadores estavam reunidas todas as ciências e os melhores sábios do século XV. Grandes progressos foram alcançados, a começar pelo desenvolvimento das caravelas, estes pequenos barcos capazes de navegar com ventos contrários. Pelas caravelas foi possível chegar aos oceanos longínquos.
O Gótico Flamejante de mestre Huguet é evidente nos grandes vitrais, permitindo dar muita luminosidade à Capela, em particular aos túmulos centrais. A construção da Capela do Fundador foi terminada em 1433, no ano da morte de D. João I. Em 1434, o seu corpo e o da sua esposa, Filipa de Lencastre falecida em 1415, ocuparam os seus lugares na Capela.
Huguet concebeu uma capela de forma quadrada, com um corpo central em octógono, coberto por uma cúpula em estrela. Na parede Sul, podemos encontrar os túmulos do rei D. Pedro e da sua esposa Isabel de Aragão, os de D. Henrique, do infante D. João e da sua esposa Isabel e finalmente, o “infante Santo”, D. Fernando. Na parede Oeste, encontramos os túmulos do rei D. Afonso V, D. João II, o principe D. Afonso e os filhos de D. João II.
A Capela do Fundador chegou até nós praticamente intacta, só mesmo o famoso terramoto de 1755 conseguirá destruir a flecha da cúpula. Os túmulos foram danificados durante as invasões napoleónicas. Foi preciso esperar pelo fim do século XIX para que os trabalhos de restauro fossem efectuados, dirigidos por José Augusto Fragoso.
Claustro Afonso V
O claustro Afonso V, nomeado em honra do 12° rei de Portugal (1432 – 1481) é um claustro secundário se o compararmos com o Claustro Real. Mas ele possui um encanto que lhe é único, com o seu pequeno jardim, a sua fonte e os seus dois níveis.
Um atelier de restauro foi aqui instalado. Não lhe falta trabalho!
Uma janela parece enterrada no chão. Se olharmos mais de perto, apercebemos-nos que foi a solução encontrada pelos engenheiros para trazer luz do dia à sala.
Temos que lembrar que o mosteiro sofreu importantes modificações e remodelações durante o século XIX. Dois claustros foram demolidos, e retirou-se todas as imagens religiosas no contexto do fim das ordens em 1834.
Para poder restaurar o mosteiro no seu estado prévio, antes das destruições napoleónicas, o encarregado pelo restauro, Luís Mouzinho de Albuquerque, vai basear os seus trabalhos numa série de desenhos. Estes desenhos, obra de Thomas Pitt, um viajante inglês que visitou a Batalha no século XVIII, já tinham permitido dar a conhecer o Mosteiro por toda a Europa.
Soldado desconhecido: Sala do Capítulo
Cada país teve a sua parte de guerras, de batalhas, e por conseguinte, de mortes, de desespero, de heróis que deram a sua vida pela Pátria. Na Sala do Capitulo do Mosteiro da Batalha encontra-se o “soldado desconhecido”… ou melhor, dois soldados desconhecidos.
Esta Sala foi concebida pelo primeiro arquitecto do mosteiro, Afonso Domingues, e foi terminada pelo mestre Huguet, entre 1402 e 1438. O vitral só foi incluído em 1514. A Sala, tal como o Claustro Real que lhe dá acesso, apresentam características notáveis do estilo Gótico.
Os soldados desconhecidos
A Sala do Capitulo comemora os portugueses mortos pela Pátria. Que a guerra deles fosse justa ou não, isso pouco interessa. Eles morreram ao serviço de Portugal, e como tal devem ser respeitados, e honrados. Por isso, dois soldados montam a guarda à última morada dos seus colegas mortos no exercício do Dever.
O primeiro soldado morreu durante a Primeira Guerra Mundial, em França. O seu corpo, irreconhecível pela família, chegou à Batalha em 1921. O segundo soldado veio de Moçambique, prefigurando o que seria a horrível guerra colonial dos anos 1960 e 70.
O túmulo possui dois símbolos fortes, lembranças do esforço de guerra português:
- O Cristo das Trincheiras, vindo das Flandres, em França. Durante os intensos combates na Batalha de la Lys, este Cristo, vindo de um calvário da cidade de Neuve-Chapelle, foi encontrado, de pé. Mutilado, tal como os soldados portugueses, ele foi resgatado. Ele simbolisa a coragem e a Fé dos soldados portugueses durante a terrível Primeira Guerra Mundial. Num grande gesto de amizade, a França doou o Cristo a Portugal em 1958.
- O Lampadário, “Chama da Pátria” : nele arde um azeito proveniente de oliveiras portuguesas.
Talvez não venha a existir mais monumentos em honra de soldados desconhecidos. Mas não pense que será por falta de guerras! Simplesmente, hoje em dia é muito fácil determinar a identidade de um soldado morto em combate, pelo seu ADN…
Podemos constatá-lo, o monumento é frequentemente escurecido pela poluição, pela sua proximidade com uma grande estrada. Mesmo com trabalhos de restauro regulares, as pedras são atacadas permanentemente pela poluição. Não existe outra solução do que desviar a estrada, mas isso não parece que vai acontecer no próximo século…
Apesar de tudo, este Património Mundial da Humanidade guarda toda a sua força e toda a sua simbólica tão peculiar para o povo português. Esperemos que seja para todo o sempre!