As mulheres que caminhavam com grandes vasilhas de leite à cabeça eram coisa do dia a dia antigamente. Por carreiros estreitos, iam vender o leite de que não precisavam ao "posto de recepção de leite" mais próximo, propriedade do gigante agro-alimentar Nestlé...
O leite, produzido em casa
A produção leiteira portuguesa, antes do 25 de Abril, era um trabalho de pessoas humildes. Possuía-se uma, duas, três vacas, que davam um pouco de leite para a família. O excedente era vendido depois em pontos de recolha, onde se tinha que ir levar o leite, na maioria por mulheres.
São recordações emocionadas de mulheres que nos contam estes tempos antigos. Depois de ordenhar manualmente a vaca, levava-se este leite “a mais” em vasilhas de alumínio ao “posto de recepção de leite”, ou, simplesmente, “o posto”.
Estas vasilhas, que podiam ter de 15 a 25 litros, eram assim tantos quilos a trazer em cima da cabeça. Este transporte era, mais uma vez, coisa de mulheres. Um momento quase de paz para elas, que as fazia mudar de rotina e sair da pequena propriedade familiar. Um momento também, talvez, para encontrar outras pessoas, e, quem sabe, um namorado…
Era um dos raros momentos onde se podia encontrar pessoas de outra aldeia com uma certa regularidade. Também era um momento, dizem as más línguas, onde era fácil avaliar a riqueza de cada um, pela quantidade de leite que se trazia…
Sociedade de Produtos Lácteos
Foi em 1923 que Egas Moniz, o célebre médico neurologista português, conseguiu criar uma sociedade na sua aldeia de onde era natural, Avanca, perto de Estarreja. Estamos numa região bem conhecida pela sua produção de leite, a poucos quilómetros de Ovar e de Aveiro…
Egas Moniz, que ainda não tinha sido galardoado com o Nobel de medicina (em 1949), era um grande admirador do suíço Henri Nestlé. Foi no seu seguimento que ele contribuiu para o estabelecimento desta nova empresa, querendo também ele melhorar a alimentação das crianças.
A primeira actividade da nova empresa foi a produção de leite em pó para bebés. Em 1933, a Sociedade de Produtos Lácteos consegue obter a exclusividade em Portugal dos produtos da Nestlé.
Em 1973, a empresa é totalmente controlada pela sua casa mãe, com a sua mudança de nome. Doravante, é a Nestlé Portugal.
Rede de colheita
Para recuperar o leite produzido em Portugal, a empresa criou uma rede de colheita. Em quase todas as aldeias produtoras de leite, construiu-se um pequeno edifício, idêntico em todo o lado, onde se recuperava o trabalho das vacas. Era aqui que se media a quantidade de leite que o produtor trazia. Uma vez por mês, eram pagos pela sua produção.
Estava sempre aberto, nos sete dias da semana, mas com horários fixos. Duas vezes por dia, um camião vinha recuperar o leite, onde seguia depois para um centro de tratamento para lá ser pasteurizado.
A empresa de Avanca contribuiu decisivamente para fazer baixar a mortalidade infantil, fruto do melhoramento que proporcionou na alimentação das crianças. Para mais, desenvolveu a produção de leite em Portugal, melhorando um pouco a vida de muitos camponeses.
Nestlé Portugal
Hoje, a Nestlé está sempre presente em Avanca, onde se encontra uma das suas quatro fábricas portuguesas, a par de Porto, Coruche e São Miguel nos Açores. No total, são 1850 empregados que trabalham para a Nestlé em Portugal.
Em Avanca, produz-se os cereais do pequeno almoço, como Chocapic, Nesquik ou Estrelitas. Também se produz os cafés solúveis, como Tofina ou Mokambo…
A Nestlé é sempre hoje uma empresa inevitável do dia a dia dos Portugueses. No passado, fez muito pelo melhoramento da qualidade de vida portuguesa. Agora, sendo uma grande multinacional agro-alimentar, a Nestlé é criticada, como as outras empresas do mesmo género. Pessoalmente, o único verdadeiro defeito que posso encontrar à Nestlé, é de não ser uma empresa portuguesa…